Terça-feira, 2 de Outubro de 2012

As manifestações e a Democracia

Depois do gigantesco protesto anti-troika e anti-austeridade que agregou 33 manifestações a nível nacional no dia 15 de Setembro último, urge proferir umas palavras sobre o assunto. 

 

No 1º semestre do Mestrado que ainda frequento, tive uma "cadeira" que dava pelo nome de Política Portuguesa, leccionada pelo Arquitecto José António Saraiva, director do jornal SOL.

 

Esta disciplina tinha como base um livro escrito pelo mesmo, que consistia numa reunião de contributos e reflexões pessoais, fruto de conclusões obtidas ao longo de 25 anos de exercício de comentários políticos semanais. 

 

Num capítulo, está exposta a seguinte ideia:

 

"As manifestações de rua não podem ser vistas como testes ao Governo em funções, nem delas se devem tirar ilações. Primeiro, porque quem se manifesta não são os mais numerosos mas os mais aguerridos. Depois, porque em Democracia o controlo do Governo não é feito pela rua mas sim através das formas previstas na Constituição - seja o Parlamento, sejam os Tribunais, seja o Presidente da República. É preciso perceber que o sistema democrático também se alimenta de formalismos e é importante que eles sejam respeitados para o sistema poder funcionar. Olhar as manifestações como atestados de legitimição ou como votos de censura aos Governos é admitir a selva. (...) Os Governos não se legitimam nem caem através do poder da rua mas do poder do voto. (...) Costumo dizer que todas as manifestações têm um cunho antidemocrático. Porque têm, no fundo, por objectivo impedir o Governo legitimamente eleito de fazer o que quer fazer ou obrigá-lo a fazer o que não quer fazer. Acresce que hoje, com os meios de comunicação de massas que existem, é muito fácil organizar uma manifestação num sentido ou no sentido contrário. Portanto, não é sério pretender retirar significado político de uma manifestação."


Impressionado? Talvez sim...talvez não. A pluralidade e diversidade sempre serviram para enriquecer o debate.

 

Ora, em meu entender, em Política, como é de uma ciência social e humana que se trata, de facto, devem-se tirar ilações de tudo o que é feito. 

 

Por detrás da Política, há pessoas, há vidas, há emoções e sentimentos e um Governo formado por Homens tem a obrigação de reflectir no que se passa na sociedade que o envolve e que o mandatou. 

 

É verdade, evidentemente que há formalismos (ainda bem), e esses devem ser cumpridos, mas não posso deixar de dizer que uma coisa não é antagónica da outra. 

 

Não partilho da opinião de que observar a realidade e ajustar-se a ela seja um convite à instauração da selva.

 

Os Governantes nem sempre estão certos - e até fiéis ao seu próprio programa - e não representa nenhuma humilhação dar um passo atrás quando tudo aponta no sentido de que o precipício esteja perto. Antes pelo contrário, revela sensatez e sabedoria. 

 

A manifestação é um direito adquirido e consagrado e é um dos instrumentos do cidadão de participação na vida pública. O seu exercicio é saudável desde que decorra sem a perturbação da paz e da ordem pública.

 

Os Governos não devem nortear a sua acção pela rua, mas também não a devem ignorar.

 

Quanto à evolução dos meios de comunicação, felizmente que assim é. Não torna menos válidas ou crediveis as manifestações, apenas potencia que mais vozes se façam ouvir, que mais anseios e preocupações não acabem por esmoreçer num café de bairro, maior palco dos lamentos portugueses.

 

Cumprimentos,

 

Hugo Baião. 

 

 

 

 

 

 

 

 

publicado por polideias às 02:57
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